FCA espera queda forte, atrasa planos, mas mantém investimentos

Filosa: reuniões diárias para monitorar o desenvolvimento da crise

Por PEDRO KUTNEY, AB
  • 31/03/2020 - 20:36
  • | Atualizado há 2 anos, 9 meses
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    Desde fevereiro, todos os dias às 9h da manhã Antonio Filosa, presidente da FCA Latam, participa de teleconferência com o comitê global de gestão da Fiat Chrysler Automobiles. Logo depois, às 10h, o executivo conversa com a diretoria da região América Latina. Tudo para monitorar o desenvolvimento da crise causada pela pandemia do coronavírus e planejar as ações seguintes – incluindo um amplo programa social de ajuda para combater a disseminação doença divulgado na terça-feira, 31. Ele admite que o tombo é grande, o problema de caixa das empresas é muito sério, mas pondera que os investimentos da companhia na região estão mantidos, embora alguns lançamentos devam ser atrasados entre três e doze meses, e é enfático ao dizer que demissões serão evitadas a todo custo.



    A produção das fábricas da FCA no Brasil e na Argentina estão totalmente paralisadas desde a semana passada. Por enquanto, o retorno ao trabalho está previsto para 21 de abril. Filosa aponta que até a metade de março as vendas iam bem, em linha com a projeção de crescimento em torno de 8% esperado para este ano. Mas depois disso o tudo parou: “O que aconteceu nas últimas duas semanas é incrível, o mercado brasileiro caiu 90%, o argentino 100% e cerca de 80% nos demais países da região. Ninguém esperava por isso e fazer qualquer previsão agora é muito difícil, o segundo trimestre já está muito comprometido, mas esperamos começar a ver recuperação no terceiro e quarto trimestres”, prevê o presidente da FCA Latam.

    “Existem muitas previsões, mas é certo que o tombo é grande. Os mais pessimistas falam em queda de 60% nas vendas [de veículos no Brasil], os mais otimistas apontam 35%. Eu diria que 40% é um número razoável em relação ao que estamos vendo hoje. Será um ano de sacrifício”, avalia Antonio Filosa.



    INVESTIMENTOS E LANÇAMENTOS POSTERGADOS



    O executivo afirma que o plano de investimento da FCA no Brasil está mantido, mas adianta que o programa de R$ 14 bilhões previsto para o período 2018-2024 deverá ser estendido em cerca de um ano, até 2025. A primeira “vítima” desse atraso foi o lançamento da nova picape Strada, que estava marcado para 7 de abril. Filosa diz que ainda não há uma nova data agendada, mas deverá ser três meses adiante.

    Ele lamenta: “Estava tudo pronto, a nova Strada é uma joia de design e tecnologia, iria começar agora a recuperar um investimento feito no desenvolvimento do modelo ao longo dos últimos 24 meses, agora isso vai demorar mais a acontecer, pois não vamos vender nenhuma Strada nos próximos meses e esse dinheiro não retorna”.

    Segundo Filosa, a nova linha de produção de motores turbinados em Betim (MG) já está 60% pronta, mas como agora está tudo parado é possível que a inauguração, prevista para o último trimestre, talvez fique para o começo de 2021.

    Da mesma forma, os lançamentos de dois SUVs Fiat e um Jeep de sete assentos devem atrasar de dois a seis meses. “Com a paralisação da produção e queda abrupta das vendas, precisamos proteger o caixa e esses atrasos são inevitáveis”, explica Filosa.

    DEMISSÕES SERÃO EVITADAS



    “Demissão é uma palavra que nem queremos ouvir. Claro que não posso garantir, mas será a última medida a ser usada, é extremamente danoso perder trabalhadores qualificados”, enfatiza Antonio Filosa.



    O presidente da FCA Latam destaca que qualquer demissão trará uma perda dobrada à indústria: “Perco na hora de demitir e depois na hora de ter de recontratar e treinar de novo os funcionários”, avalia.

    Filosa também disse que no momento também não está nos planos adoção de medidas de flexibilização trabalhista, como suspensão temporária de contratos de trabalho (layoff) ou redução de jornada e salários. Segundo ele, a empresa ainda espera pelas definições do governo e do Congresso em relação à Medida Provisória que poderá trazer algumas alternativas para preservar empregos e gastos das empresa. “Vamos esperar e estudar o que é possível fazer.”

    Para o executivo, o governo foi rápido e “está na direção correta” em adotar medidas de estímulo que deverão injetar algo como R$ 150 bilhões na economia, principalmente para socorrer pequenos negócios e as pessoas mais vulneráveis. Mas Filosa pondera que, em um segundo momento, será necessário também dar apoio financeiro aos grandes empregadores, “como é o caso do setor automotivo, que emprega cerca de 1 milhão de pessoas em toda sua cadeia, tem algo como 7 mil fornecedores diretos, representa 4% do PIB nacional e 18% do PIB industrial”.

    A FCA está monitorando a situação de fornecedores e concessionários. A avaliação geral é que se o sufoco de caixa ultrapassar abril, “o problema crítico pode virar crônico”, alerta Filosa. Por isso, para evitar um possível colapso da cadeia, ele defende que o governo deverá adotar mais medidas de salvamento e estímulo. “Existem ferramentas para tornar essa crise doída mais gerenciável”, sugere.

    Olhando em perspectiva, Filosa avalia que o Brasil poderá sair fortalecido da pandemia e recuperar sua economia em 2021 mais rápido que outros países. Ele destaca que as medidas de isolamento social e paralisação das fábricas para evitar a disseminação do coronavírus foram tomadas no País 28 dias após o primeiro caso de contágio. “É exatamente o mesmo tempo que a China levou para suspender a produção da indústria, enquanto Itália e Estados Unidos demoraram mais. O Brasil entrou depois na crise, mas agiu mais rápido. Portanto, talvez possamos sair mais rápido dessa situação de quarentena”, espera.

    Filosa avalia que todo período de reconstrução é uma importante oportunidade para melhorar um país e sua sociedade. Ele lembra que a Itália saiu destruída da Segunda Guerra Mundial, mas os anos que vieram após o conflito foram os de maior desenvolvimento econômico da história italiana – e a Fiat surgiu como empresa que liderou a reconstrução.