Remuneração de executivos brasileiros incentiva empresa a priorizar lucro de curto prazo

Estudo mostra que, nas empresas nacionais, a maior parte dos ganho se benefícios depende do lucro anual

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São Paulo

Quase dois terços da remuneração dos executivos de grandes empresas brasileiras de capital aberto é composta por salário fixo e bônus vinculados a resultados de curto prazo (semestrais e anuais), de acordo com levantamento feito pela consultoria SG Comp Partners.

O dado contrasta com o que ocorre, por exemplo, no mercado norte-americano, em que cerca de 40% da remuneração é composta por salário e incentivos de curto prazo e 60% por benefícios recebidos em prazos superiores a um ano. No Brasil, a relação é de 65% e 35%, respectivamente.

Os principais incentivos de longo prazo utilizados na fórmula de remuneração das empresas, tanto no Brasil como nos EUA, envolvem pagamento com pacote de ações e opções de compra desses papéis.

Para garantir a questão do prazo, é fixada uma carência para que o executivo possa incorporar esse ativo ao seu patrimônio (de três a cinco anos) e há regras para impedir a venda dos papéis antes de pelo menos outros três anos (mecanismo “lock-up”).

Executivo no aeroporto de Congonhas, em São Paulo - Keiny Andrade/Folhapress

A remuneração de curto prazo, além do salário fixo, engloba bônus semestrais ou anuais, vinculados a metas de lucro líquido ou Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização).

“O problema, quando se incentiva desproporcionalmente a performance de curto prazo, é que podem surgir efeitos colaterais relevantes. Potencializa-se um quadro em que a direção pode tomar ações visando a aceleração de resultados, podendo até mesmo sacrificar o crescimento futuro”, afirma Paulo Saliby, sócio fundador da consultoria especializada em planos de remuneração.

O especialista afirma que a busca de um crescimento acelerado pode se dar à custa do endividamento dessas companhias, o que não compromete o bônus ao fim do ano, mas amplia significativamente os riscos para os acionistas.

No Brasil, as empresas costumam optar por um sistema que se aproxima de “um terço, um terço, um terço” e tenta equilibrar o peso de cada componente na remuneração (salário fixo, bônus semestral ou anual e incentivos de longo prazo).

Na amostra obtida pelo levantamento da consultoria, a relação é 29%, 36% e 35%, respectivamente, no mercado nacional. Nos EUA, são 18%, 21% e 60%, respectivamente.

Saliby recomenda que o pacote de remuneração da alta direção dê um peso superior a 50% do total dos proventos de longo prazo, como forma de alinhar os interesses de executivos e acionistas.

A mudança também atende aos interesses dos próprios executivos, pois cada uma dessas remunerações tem uma função na geração de riqueza para o executivo.

“O fixo é para viver. O bônus, para viver bem. A remuneração de longo prazo, para formar patrimônio e garantir a aposentadoria”, afirma Saliby.

O levantamento considerou dez empresas privadas de capital aberto com ações negociadas no mercado nacional, entre as 25 maiores, selecionadas por terem até sete pessoas em sua diretoria. 

O objetivo foi evitar distorções em relação ao critério de divulgação adotado pelas empresas listadas na Bolsa dos Estados Unidos, que divulgam as cincos maiores remunerações.

No Brasil, as companhias devem divulgar o maior salário e a média do valor pago à diretoria. A amostra americana considerou empresas com valor de mercado em dólar semelhante ao das brasileiras.

Entre as empresas nacionais estão a Bolsa brasileira B3, a Suzano, da área de Papel e Celulose, e o IRB (Instituto de Resseguros do Brasil), as únicas selecionadas com mais de 50% da remuneração dos altos executivos vinculada ao longo prazo. Também são as que dão menor peso aos bônus de curto prazo (participação entre 10% e 20%).

O levantamento mostrou ainda que a remuneração dos executivos de grandes empresas nacionais corresponde a cerca de um terço do valor pago aos gestores de companhias norte-americanas com mesmo valor de mercado em dólares.

Os brasileiros recebem salário equivalente a cerca de 50% do que é pago aos americanos. O valor dos bônus também é cerca de 50% menor. Na renumeração de longo prazo, o pagamento das brasileiras corresponde a cerca de 20% do que é gasto pelas americanas. 

O cálculo considera câmbio médio de R$ 3,89. Mesmo se fosse utilizada uma cotação mais baixa, que deixasse os valores fixo e de curto prazo mais próximos, ainda haveria substancial diferença na remuneração em razão dos ganhos com os planos de ações.

O valor médio do pacote de remuneração anual por executivo chega a pouco mais de US$ 4 milhões nos EUA e a US$ 1,3 milhão no Brasil (cerca de R$ 15 milhões e R$ 5 milhões, respectivamente, considerando o câmbio do estudo).

O valor de mercado das empresas selecionadas, tanto brasileiras como americanas, é de cerca de US$ 17 bilhões. Ou seja, proporcionalmente ao valor de mercado, as americanas pagam mais.

Entre as empresas americanas que fazem parte do grupo selecionado estão Walgreens, Best Buy, Pinnacle West Capital, Goodyear e Macy’s.

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