A proposta de retirar da Constituição a obrigação do reajuste do salário mínimo é horrível, mas isso não quer dizer que seu aumento deva ser grande neste momento.
O debate sobre o salário mínimo é maniqueísta. De um lado, o cálculo extemporâneo do Dieese com o seu valor “ideal”, segundo o instituto, de quase R$ 4.000 em vez dos R$ 998 atuais. Do outro, a ideia de que o mínimo causa somente desemprego e desordem das contas públicas.
É difícil analisar os efeitos do salário mínimo sobre a economia porque normalmente escolhemos dentre dois modelos opostos.
Um se baseia no fato de que elevação de salário leva os trabalhadores às compras, levantando a demanda, criando empregos e melhorando a situação dos mais pobres. Ademais, como no mercado de trabalho é mais comum que as empresas tenham mais poder de mercado que os trabalhadores, reajustes compensam o baixo poder de barganha dos empregados, tornando esse mercado mais eficiente.
A arrecadação de impostos também se eleva pelo maior consumo das famílias.
O outro modelo começa com o fato de que salários são custos das empresas. Assim, qualquer incremento do salário mínimo encarece a produção, as empresas contratam menos, há maior inflação e o desemprego dispara. Para completar, como salário mínimo é um gasto para o governo por conta, dentre outros fatores, das aposentadorias vinculadas a ele, qualquer acréscimo leva a maior déficit público —a cada aumento de R$ 1 no mínimo, despesas públicas crescem R$ 300 milhões.
Qual o modelo está certo?
Os dois! Um salário mínimo mais alto cria e destrói empregos. Modera o poder de mercado das empresas e eleva os custos de produção. Multiplica o déficit público pelo lado das despesas e o reduz pelo lado das receitas. Aquece e desaquece a economia. Melhora a distribuição de renda pela maior renda dos mais pobres e piora porque se houver perda de empregos, será também dos mais pobres.
No fundo, a relação entre maior salário mínimo e bem-estar é não linear e depende do grau do reajuste e da relação entre o valor do mínimo e a produtividade dos trabalhadores.
Ao longo dos anos, é preciso que a produtividade cresça. No curto prazo, extremos são ruins. Congelar o mínimo piora a desigualdade de renda sem gerar empregos. Mas seguir o valor do Dieese é loucura;
desemprego e desigualdade explodiriam.
A política ideal de salário mínimo deve ser pró-cíclica.
Quando a economia vai bem, o governo deve reajustá-lo acima da média histórica. Quando a economia vai mal, o mínimo deve subir mais devagar (sem nunca congelar ou reduzir). Essa regra segue a melhor evidência da literatura econômica, como o recente trabalho de Arindrajit Dube para os EUA. Lá, salários mínimos regionais subiram pouco nas últimas décadas, e 1% de aumento do mínimo reduz a pobreza entre 0,22 e 0,46%.
Não há dúvidas que salários mínimos estaduais nos EUA, com a economia aquecida, deveriam estar em maiores patamares do que hoje.
No Brasil, estamos em crise e o salário mínimo, ainda bem, não é mais tão baixo como no passado.
É improvável que um complemento de R$ 30 ou R$ 40 cause qualquer desemprego. Há efeitos sobre as contas públicas, mas não é gasto horroroso. O governo deveria copiar a política do governo petista, de reajustes generosos, neste momento? Também não. Efeitos sobre o desemprego apareceriam. Maiores acréscimos, só quando a economia se recuperar.
Nem tanto nem tão pouco.
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